Entenda a relação entre crise climática e habitação no Brasil

Todos os anos, desastres ambientais ganham destaque nos noticiários e as histórias trágicas de pessoas que perderam suas casas em enchentes se repetem. Esse cenário coloca em evidência desafios para o desenvolvimento sustentável que as cidades enfrentam e deixa claro como a crise climática vem agravando as condições de habitação no Brasil.

Falar sobre essa relação por vezes é delicado, por conta do sofrimento humano que ela carrega, mas é necessário para expor o desafio que já afeta essa geração e deve se intensificar para as próximas. Essa reflexão é importante até mesmo para provocar a criação de soluções, a partir de dados, análises, experiências e conhecimento especializado.


A crise climática intensifica as chuvas?

O que estamos chamando de crise climática são as consequências de um modelo econômico com alta emissão de gases de efeito estufa, como gás carbônico e metano, que pouco a pouco aumentam a temperatura do planeta, gerando alterações do clima.

É verdade que, além do que sempre escutamos falar sobre aquecimento global e derretimento de calotas polares, a crise climática se manifesta em outros eventos extremos, como picos calor e estiagem em algumas regiões e  aumento de chuvas concentradas em outras – tempestades que potencializam os deslizamentos em encostas íngremes e inundações nos fundos de vale.

Vários autores e estudos têm relatado os efeitos sociais e econômicos negativos, e às vezes trágicos, em vários países e em diversas cidades brasileiras, decorrentes desse processo de mudanças climáticas que o mundo está experienciando. Dentre eles, o relatório AR6, do The Intergovernmental Panel on Climate Change – IPCC, alerta para cenários futuros em que o aumento de temperatura global deverá mais que dobrar a ocorrência desses eventos de super chuva, com intensidades 30% maiores.

Uma vez que as grandes cidades estão estruturadas com seus centros urbanos mais bem equipados e protegidos e as periferias são estabelecidas em áreas carentes de infraestrutura urbana adequada e, por consequência, com maior probabilidade de risco, o problema ambiental torna-se também social e de responsabilidade coletiva.


O déficit habitacional no Brasil

A ONU apontou que em 2020 aconteceram 30,7 milhões de deslocamentos devido a desastres relacionados ao clima. De acordo com a pesquisa do Instituto Ipsos “Mudanças Climáticas: Gravidade dos Efeitos e Expectativas de Deslocamento”, 49% das pessoas acreditam que vão precisar mudar de endereço nos próximos 25 anos devido às mudanças climáticas no Brasil.

Sabe-se que ninguém escolhe habitar uma região ou construção de risco se tiver a opção de viver de forma mais segura. É a ausência de condições econômicas e de oferta pública de áreas urbanizáveis seguras que faz com que famílias de baixa renda se instalem em áreas sujeitas a risco.

É possível notar que, quando enchentes e deslizamentos ocorrem, os territórios mais vulneráveis e prejudicados são as favelas e moradias em encostas. É por conta do risco geográfico desses territórios que catástrofes ambientais atingem principalmente as populações negras no Brasil. No Brasil, 55% da população é negra, mas entre moradores de favelas os negros chegam a uma porcentagem muito maior – 67% segundo a pesquisa do Instituto Locomotiva em parceria com o Data Favela e a Central Única das Favelas (Cufa).

Na gestão de risco, cabe ao poder público intensificar as ações de identificação de áreas de risco, de monitoramento, além do trabalho social diligente para informar e preparar continuamente a população para a colaboração no enfrentamento das emergências de eventos climáticos extremos, que tendem a se intensificar.

De acordo com estudo “Mapeamento Anual das Áreas Urbanizadas no Brasil entre 1985 e 2021” do MapBiomas, as 5 cidades cidades que hoje têm mais áreas de risco são: Salvador (BA), Ribeirão das Neves (MG), Jaboatão dos Guararapes (PE), São Paulo (SP) e Recife (PE).

Dados como estes apontados por esse mapa valioso devem servir como guia para políticas públicas atualizadas e coerentes com a legislação brasileira. A Lei n. 12.608/2012 institui a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil – PNPDEC e enfatiza a necessidade de uma gestão articulada de diversas políticas setoriais com foco na prevenção e participação.


Estratégias de mitigação

As consequências da crise climática são uma realidade em muitos cantos do Brasil. E a gestão das águas é um importante passo na resolução desses problemas. Parte do desafio atual é traçar soluções que compreendem a interseção entre o ambiental e o social para mitigar os impactos das mudanças climáticas nos contextos urbanos.

Mas é a partir da gestão social associada às ações de planejamento urbano preventivo e zeladoria urbana que se poderá vislumbrar um cenário de uma cidade atenta para o enfrentamento dos eventos climáticos extremos, ou seja, com maior resiliência.

Identificadas as áreas e comunidades sujeitas a risco, o poder público precisa implementar um trabalho social diligente no sentido de informar, monitorar e preparar continuamente a população para a observação dos sinais de risco, para a colaboração na fiscalização e prevenção de novas ocupações, para o enfrentamento das emergências e, quando necessário, na organização da remoção e reassentamento das famílias em situação de risco.

Essa realidade está conectada com a pauta de desenvolvimento sustentável das cidades e redução das desigualdades dos ODSs. Por meio de políticas públicas e profundo trabalho de gestão social é possível combater a desigualdade nas cidades, mitigar as consequências da crise climática sem excluir as periferias.Conheça mais sobre a atuação da Diagonal para a evolução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, principalmente pelo desenvolvimento de cidades e comunidades sustentáveis, que é a nossa principal causa.



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